Há uma tendência nos seres humanos para acusação mútua e constante. A proximidade física seja a dos familiares sob o mesmo teto, seja a da convivência social, torna inevitáveis as oportunidades de comparações, desde aquelas que têm como causa a diferença de temperamentos, como as provenientes de filosofias de vida e convicções pessoais.<br />
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As interferências sociais tornam-se fonte de inesgotáveis contribuições para o desenvolvimento dos sentimentos de culpa: aquele silêncio denotando reprovação, este olhar de deboche manifestando nítido desprezo. Algumas palavras ditas ao acaso podem ser uma evidência de zombaria.<br />
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A verdade é que é difícil avaliar quão prejudiciais podem ser muitas dessas ingerências na vida do outro.<br />
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Bem mais freqüentemente ao que imaginam, pais, cônjuges, desenvolvem espécies de chantagem: “Você ainda vai acabar comigo. E, quando eu morrer, você se arrependerá!”<br />
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São palavras pronunciadas em momentos de cólera e que, conquanto logo esquecidas por quem as proferiu, podem deixar profundas cicatrizes naquele a quem foram dirigidas.<br />
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Todos somos sensíveis em maior ou menor escala, à chantagem e às críticas, embora envidemos esforços para que isso seja percebido. Censuras mordazes aqui, silenciosas ali são, todavia, sempre doloridas. Até mesmo um conselho, quando não solicitado, pode esconder uma crítica velada, esmagando quem o ouve - no comentário de Paul Tournier, em seu livro “Culpa e Graça”.<br />
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Em “Psiquiatria Moral Experimental”, H. Baruk analisa alguns tipos de agressões como sendo uma defesa dos fracos, em cujas mentes foram colocados sentimentos tremendos de culpa, através de afirmações pesadas, julgamentos levianos, desprezo ou mesmo censuras descabidas. A educação pode construir-se em um cultivo intenso de culpa quando pais, preocupados em demasia com a formação moral e com o sucesso de seus filhos, exageram em suas atitudes repressivas. Até mesmo reprovações discretas podem mudar sentimentos de culpa: “Você não se envergonha de agir assim?”; “você não presta para nada”; “o que os outros vão dizer?”; não são poucos os lares onde os filhos ouvem reprimendas como essas.<br />
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É o peso sobre os ombros da criança, da reputação social de seus pais. Ela já começa a desenvolver culpa por envergonha-los. E o que dizer, na hora da apresentação dos boletins escolares, quando as notas são baixas?<br />
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O sentimento de culpa gerado pela insinuação leva a criança à mentira. Há ainda a tendência de pais e mestres projetarem os próprios preconceitos, culpas problemas outros não resolvidos, na educação ao filho. Assim, pais infelizes e esgotados em suas atividades profissionais aborrecem-se por nada com as crianças; mães frustradas despejam nelas seus desapontamentos, punindo-as energicamente, desenvolvendo errôneos conceitos de culpa e inseguranças.<br />
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Outros pais, ainda, por preconceito, inveja, ciúmes ou por simples implicância, fazem explícitas restrições às amizades dos filhos, que têm de decidir entre duas culpas com relação aos pais.<br />
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Um exemplo bem antigo desse fato é encontrado na Bíblia, no primeiro livro de Samuel, quando Saul, primeiro rei de Israel, por inveja censura seu filho Jônatas pela amizade dele com Davi como se a reprovasse.